quarta-feira, 11 de maio de 2016

Nise: O Coração da Loucura

Direção: Roberto Berliner, 2016.
Nise da Silveira foi uma das primeiras mulheres brasileiras formada em Medicina, e iniciou uma revolução na psiquiatria brasileira e o tratamento com pacientes em hospitais psiquiátricos, e o filme conta um pedaço de sua história. O recorte dessa história que nos é apresentado aqui é de um período em que Nise volta a trabalhar em seu antigo hospital, só que em uma nova função, pois se recusou a utilizar em seu ofício alguns métodos de tortura para uma possível cura dos pacientes. A data é 1944, e o local é o Centro Psiquiátrico Nacional Pedro II, no Rio de Janeiro, mais precisamente no Engenho de Dentro – guardem esse nome. Nise é resignada para o setor de Terapia Ocupacional, onde os pacientes eram colocados para fazer as tarefas de funcionários do local, como limpeza e manutenção do ambiente. Observando todos os problemas dali, a nossa protagonista inicia uma revolução no tratamento dos pacientes.
            
A história dessa mulher é imensamente importante para o Brasil, e graças a muitas pessoas é que temos, hoje, um filme de alto nível para nos contar um pouco sobre ela. Vemos na ficção, tanto cinematográfica quanto literária, um crescimento muito grande de personagens femininas fortes, e é muito gratificantes observar a história de uma mulher real vir à tona nesse momento, e ser tratada com tamanho carinho. Se ano passado nós tivemos Que Horas Ela Volta? sendo um dos grandes filmes brasileiros, Nise: O Coração da Loucura não fica atrás não. O diretor traz uma simplicidade e uma delicadeza de Nise mesclada com a brutalidade dos hospitais psiquiátricos da época. O hospital (e o filme) é retratado como sujo, cinza e fúnebre até a chegada de Nise, que tenta trazer aos poucos um pouco de cor, luz e vida ao local.

            Na década de 1940, era muito comum o tratamento de pacientes em instituições psiquiátricas ser através da força, tortura, eletrochoques, etc. E o filme retrata isso muito bem, trazendo como vilões os médicos, homens, brancos, ricos, que se preocupam única e exclusivamente em dar alta para seus pacientes, sem se importar com os meios para chegar nisso. No início do filme temos uma cena em que um paciente é tratado com eletrochoques numa palestra, e Nise é a única pessoa que se incomoda com aquilo, que se sente mal em ver alguém ser torturado, enquanto os outros médicos, homens, brancos, ricos, acham o método muito inovador e eficiente. Os homens querem se livrar de seus pacientes o mais rápido possível, finalizando o seu procedimento com a lobotomia, e a mulher só queria que os pacientes fossem tratados como seres humanos, que apenas se comunicam de uma maneira diferente. Nise encontra na arte uma maneira de entender seus pacientes (ou clientes, como é colocado no longa), e seus clientes encontram na arte uma maneira de se comunicar com o mundo e reorganizar suas vidas. O hospital nos traz personagens secundários muito interessantes, artistas, pintores e mais do que isso, grandes pessoas que só precisavam de compreensão e compaixão.

            Nossa protagonista é interpretada pela excelente Glória Pires, que não surpreende, pois já é uma grande atriz, e novamente apresenta uma personagem forte, profissional e ao mesmo tempo carinhosa, humana. Nise foi real, seus clientes também, e as obras que eles deixaram vão além da realidade, partem para a irrealidade por conseguirem, após tanto sofrimento e invisibilidade, extrair de seu interior cores e traços que parte do caos completo até a pureza da natureza. Obras atemporais produzidas no Engenho de Dentro, não o hospital, mas sim o interior do ser, o coração em sintonia com o cérebro.

            Nise: O Coração da Loucura é um excelente filme que merece ser visto por todos. É delicado e brutal, mas vai além: é puramente humano. Trata do inconsciente humano, que é um tema extremamente complexo, de uma forma natural, compreensível. Nise da Silveira merece ser conhecida e reconhecida, sua história merece ser lida, e esperamos que esse longa converse com outras pessoas para revolucionar seus corações. 

2 comentários :

  1. Primeiramente, você escreve muito bem. Dá vontade de parar tudo e ir logo assistir o filme.
    Segundo, obrigada pela indicação. Com certeza foram as horas mais bem gastas de minha vida. Que filme maravilhoso!
    Como é bom ver a história de mulheres fortes e revolucionárias sendo representada no cinema brasileiro.
    A Glória Pires está simplesmente incrível como Nise.

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    1. Olá, Débora. Seja bem vinda! Muito obrigado pelos elogios, fico extremamente contente em poder indicar algo e ter um feedback positivo. Foi uma grande surpresa para mim assistir esse filme, e espero econtrar mais surpresas agradáveis como essa. Glória Pires é realmente incrível, concordo. Gostaria muito de ver o nacional Aquarius no cinema, mas infelizmente na minha cidade são pouquíssimas opções de filmes nacionais, e quando tem são comédias, geralmente. Mas acredito que seja um grande filme também.

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