terça-feira, 22 de março de 2016

The Witch

Direção: Robert Eggers, 2015.
The Witch, ou A Bruxa, conta a história de uma família que é expulsa da vila onde moram, e acabam tendo que viver ao redor de uma floresta misteriosa. A trama se passa por volta de 1600, em uma região da Inglaterra, numa época onde várias pessoas acreditavam que Deus ainda era o centro do universo, e o fanatismo religioso predominava em parte do globo. Nesse vilarejo na Inglaterra não era diferente. A família em questão é expulsa de sua comunidade por motivos religiosos, e ainda e principalmente após alguns acontecimentos em seu novo lar, a religiosidade e a palavra de Deus falam mais alto que o próprio sangue e as relações familiares. 

Esse é o primeiro longa do diretor Robert Eggers, e ele conduz muito bem o suspense e a tensão do filme, além de sugar muito o talento do seu elenco; é um nome a ser observado. É um filme de gênero e de época, mas ao mesmo tempo nem um pouco genérico. Com uma enxurrada de filmes de terror que temos atualmente, The Witch é um suspiro de filmes que constroem uma tensão em cada cena, como The Shining (1980), por exemplo. Há várias cenas em que poderia haver grandes sustos e jump scares, mas o diretor optou por não mostrar isso, e com uma trilha sonora angustiante e takes de pura tensão é criado um clima de horror em nossas mentes, e em seguida a cena é cortada. O filme não mostra demais, nem menos, mostra numa exatidão para cada um compreender o filme da sua maneira, e não de uma maneira geral e genérica, porque quem dá sentido ao filme é quem os assiste. Então, se quiser ver um filme com grandes sustos no estilo The Blair Witch Project (1999) e The Conjuring (2013), esse não é um filme para você. Mas se você curtiu The Babadook (2014), The Gift (2015) e Goodnight Mommy (2015), The Witch merece ser visto sim.

Falando em cenas e takes, gostaria de destacar dois takes que me marcaram; um pela beleza e outro pela angústia. O primeiro envolve uma lua cheia e a silhueta de uma pessoa no centro, belíssimo, sem excesso; e o segundo envolve uma mulher e um corvo, com uma tensão criada anteriormente, esse take choca muito e dói. Aqui a filmagem é quase que exclusivamente feita com luz do sol ou de velas, o que aumenta o suspense, por não mostrar com exatidão algumas imagens. Ainda sobre, de certa forma, o visual do filme, é preciso observar a fotografia e figurino que estão impecáveis. A fotografia com a luz natural funciona muito bem, pois o filme se passa em alguma região da Inglaterra, e aqui no filme o sol não aparece; quando é dia está muito nublado, com uma iluminação fraca, aumentando a infelicidade e isolamento da família, onde é sempre cinza, e quando é noite, há apenas a luz das velas mostrando o pouco que nos é necessário para a construção do filme.

Não posso deixar de lado as atuações. A família é composta por seis pessoas, o pai (Ralph Ineson), a mãe (Kate Dickie), a filha mais velha (Anya Taylor-Joy), o filho do meio (Harvey Scrimshaw) e os gêmeos (Ellie Grainger e Lucas Dawson). Temos aqui dois atores experientes, uma jovem pupila e três crianças. Parece que quanto mais eu friso o quanto é difícil trabalhar com crianças, mais eu queimo a língua. No início do filme, achei o personagem do Harvey muito ruim, mas há uma cena em que ele está deitado onde ele dá um show de atuação para a sua idade, e os gêmeos são pouco aproveitados no início do filme, mas há uma cena em especial que a personagem da Ellie tem um destaque maior onde se consegue ver um talento a ser cultivado, e já para o final, os gêmeos tem uma ótima sintonia e funcionam muito bem como uma dupla. Mas o destaque fica realmente para Anya, que conduz o filme com uma ingenuidade mesclada com uma malícia em certos aspectos, uma bondade que por vezes é corrompida, mas tenta se redimir depois muito por conta da religião e seus pecados. Por ter um elenco tão jovem e atuando tão bem, creio o diretor tenha um dedo importante aí.

Mas é claro que o filme tem suas infelicidades. Por tratar de um tema envolvendo o fanatismo religioso, grande parte dos diálogos envolvem Deus, a Bíblia e suas passagens, e isso me incomodou um pouco, mesmo sabendo que faz parte do contexto em que o filme se passa. Há ainda a cena final que incomodou muita gente. Particularmente eu gostei, pois há uma grande margem interpretativa aqui, e refletindo algum tempo depois eu passei a gostar mais. (ALERTA SPOILER) No final, a personagem da Anya acaba matando sua mãe, sendo a última da família a sobreviver (supostamente), e esgotada, ela senta em uma cadeira e apoia sua cabeça sobre a mesa, provavelmente cochilando, e há um corte de alguns segundos. Se o filme acabasse assim, seria ótimo. Porém, ele continua em uma sequência onde a mesma acorda e se vende para o mal, fazendo parte de um ritual de bruxaria. Eu interpretei esse último final como um sonho (ou pesadelo) dela, e que o filme realmente terminou quando ela descansou então o ritual não passaria de mera imaginação. Por outro lado, a cena da venda dela para o mal, onde o bode interage com ela e o ritual todo, eu achei extremamente bem feitas e angustiantes.

A Bruxa, ou The Witch, não é um filme para todo mundo. Há uma enorme tensão do início ao fim que é construída a partir da escolha do diretor do que mostrar nas cenas em conjunto com a trilha sonora. Com atuações impecáveis, um figurino e fotografia excelentes, é um longa a ser observado e contemplado por seus vários pontos positivos, pecando em poucos aspectos.